“Hoje, a microempresa que quer crescer sai do Simples para cair no complicado.” A crítica ao sistema tributário brasileiro é do ministro da Secretaria da Micro e Pequena Empresa, Guilherme Affif Domingos. Para ele, o atual sistema de tributação brasileiro – que aumenta os tributos de acordo com a faixa da faturamento anual das empresas – impede o crescimento das micro e pequenas empresas, que hoje representam 97% dos empreendimentos no Brasil e respondem por 53% da geração de emprego.
Após dois anos parada na Câmara Federal, a Lei Geral da Micro e Pequena empresa entra em votação na próxima terça-feira (29). A pauta foi definida pelo presidente da Casa, deputado Henrique Eduardo Alves. O projeto de lei permitirá a inserção de 550 mil micro e pequenas empresas, que faturam até R$ 4,3 milhões por ano, no sistema de tributação SuperSimples.
Afif Domingos apresenta, amanhã (28) a palestra “Comércio e Serviços como foco de negócios para as micro e pequenas empresas”, durante o seminário Motores do Desenvolvimento. O evento acontece no Hotel Sehrs, Via Costeira, a partir das 8h, e terá entre os palestrantes Luiza Trajano, presidente da rede Magazine Luiza.
Em entrevista prévia à TRIBUNA, o ministro faz um panorama sobre o crescimento do microempreendedorismo no Brasil e elogia o crescimento do RN.
Uma meta que foi estabelecida desde a criação da Secretaria da Micro e Pequena Empresa foi a “desburocratização” do sistema para o micro e pequeno empreendedor. O que já foi feito para mudar essa situação?
A desburocratização passa primeiro pela legislação, que ser votada votada até o final de abril no Congresso Nacional. Nessa votação vamos ter os quatro pontos fundamentais: substituição tributária, a universalização do Simples, a unificação das obrigações acessórias nos campos trabalhista e previdenciário e, por fim, a REDESIM, que é o sistema de abertura ou fechamento de empresas em até cinco dias. São pontos que passam ora pela lei ora por ações. Nós temos um portal que deve ficar pronto em junho, começa a operar em julho, por meio de projeto piloto usado em Brasília ,e depois distribuído para todo o país.
Apesar de alguns estudos indicarem que 97% dos estabelecimentos formais do Brasil são micro e pequenas empresas, a taxa de sobrevivência dos empreendimentos não chega a cinco anos. Quais são os principais problemas enfrentados pelo pequeno empresários para se manter no mercado? A micro e pequena empresa ainda é pouco competitiva?
A taxa de sobrevivência delas não chega a cinco anos porque nós temos um sistema tributário perverso: quando o microempreendedor começa a crescer,o tributo pesa, pois o nosso sistema é progressivo em termo da cobrança de impostos. A empresa no Brasil é como caranguejo, tende a crescer de lado e não para cima. Esse é um ponto que temos que fazer: revisão os conceitos de tabela e também do processo de qualificação da empresa e dos gestores para garantir o processo de manutenção do empreendimento. Não somos muito competitivos por causa da burocracia excessiva e da falta de acesso ao crédito.
Qual é a representatividade das pequenas empresas no mercado? Em quais regiões elas são mais fortes?
As pequenas são as que mais geram emprego por unidade de capital investido. Nós representamos 53% da ocupação de mão de obra – não é uma presença pequena. Nós representamos, também, cerca de 20% do Produto Interno Bruto (PIB), e esse é o ponto que temos que crescer. A participação dessas empresas nas regiões é mais ou menos homogênea. Nas regiões onde você tem um maior processo de industrialização, também há terceirização das empresas, o que beneficia e muito o microempreendedorismo. Nos estados em que você tem menos industrializados, você tem uma área mais forte do comércio. Pois quem induz o serviço é a indústria.
Outra prioridade da Secretaria é a votação da Lei do Simples Nacional. Quais mudanças a proposta traz? Vi que ela ainda estava em votação na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado…
O capitulo da substituição tributária é que foi votado no Senado. O projeto completo da nova Lei da Micro e Pequena Empresa está na Câmara entra em plenário dia 29 de abri. Há uma coincidência de datas para efeito da votação. O mês de maio será bastante quente para que tenhamos uma agenda positiva do Congresso Nacional. O que estamos fazendo é trabalhar as diligências para evitar que esse projeto seja refeito depois.
Pela terceira vez consecutiva foi alterada a data final para implantação do eSocial. Conversando com entidades do comércio, elas apontam que os empreendedores estão assustados com essa mudança. Como a secretaria está trabalhando a adoção desse sistema pelo micro e pequeno empreendedor, que geralmente trabalha com a informalidade?
O eSocial nasceu como eFiscal. Foi uma visão dos fiscalistas. Eles montaram um sistema para colocar todas as obrigações digitais. Ou seja: em vez de mitigar, eles digitalizaram a burocracia. Então questionamos: cadê o tratamento diferenciado para a micro e pequeno empresa? Nós queremos o eSimples. Nós acreditamos que o eSocial pode melhorar os controles e facilitar o lado do micro e pequeno empreendedor. Só que, às vezes, o Fisco está mais focado em ser fiscalizador e não vê o lado de ninguém. Portanto é um belo choque de culturas que eu espero seja positivo do que aquele que está sendo feito.
Por falar em informalidade, esse é um dos problemas apontados pelos setor de comércio e serviços aqui no RN. A Secretaria Estadual de Tributação estima impacto de 30% na arrecadação de ICMS. Esse índice ainda é muito alto? O que é feito pela secretaria para estimular a formalização do pequeno empreendedor?
É preciso separar duas coisas: você tem uma informalidade vocacional, relacionada às atividades ilícitas, e tem a acidental, ligada ao desconhecimento da burocracia sobre a realidade do mundo e do mercado. Apesar dos esforços do governo do RN, nós temos uma legislação nacional que favorece a informalidade porque é complexa, principalmente nas obrigações acessórias. A porta de entrada para a formalização é o Microempreendedor Individual (MEI). Para isso você tem que mostrar a mudança social, que a formalização não é a morte do empreendedor. Infelizmente a burocracia trabalha pela informalização. Esperamos para o próximo ano — com a aprovação da lei – formalizar 1 bilhão por ano por meio de um mutirão. Quando começamos, era 12 bilhões de informais, já formalizamos 3 bilhões. Praticamente a população do Uruguai.
A tributação também comentou que muitas vezes o empreendedor se formaliza, mas continua exercendo a informalidade. Ou seja, por vezes vende sem emitir nota. A informalidade é um problema cultural? Deveríamos ter mais fiscalização?
Não é um problema cultural, mas econômico. Quando todos pagam menos o governo arrecada mais. Muitas vezes o empresário tem que emitir nota para não passar de limite de faixa, porque as nossas faixas foram feitas para a empresa não crescer. Nós temos que mexer nisso. Hoje, o empresário sai do Simples para cair no complicado. E fiscalização é sempre importante. Os fiscos são acomodados: em vez de fiscalizar, ficam criando normas para cercar a arrecadação e acabam por contribuir para a evasão do empreendedor.
O RN foi o estado que teve maior crescimento do setor de comércio e serviços entre os estados do nordeste. Em 2013, o aumento no número de vendas foi 8,8% maior do que o registrado em 2012. O que justifica esse aumento aqui no estado? É o micro e pequeno empresário que sustenta esse avanço?
Eu não tenho a menor duvida que foi o microempreendedor. Outro fator que contribuiu foi a decisão do Governo do Estado, que teve a coragem de colocar o teto do Simples no teto nacional. Isso deve ser um exemplo a ser seguido por todos os estados. Estive agora no Belém do Pará e citei o RN como um exemplo do crescimento do setor de comercio e serviços.O teto estabelecido facilita o crescimento. Além disso, o RN está com investimentos importantes: é sede na Copa do Mundo e já teve um investimento em construção, que traz um processo forte de terceirização – então as pequenas empresas também foram beneficiadas.
Fonte: Tribuna do Norte (RN)
Foto: Emanuel Amaral