Guilherme Afif Domingos, de 69 anos, paulistano de orientação política liberal acaba de materializar o que Gilberto Kassab idealizou para o seu Partido Social Democrático (PSD): uma sigla “nem de esquerda, nem de direita e nem de centro”. Até quando vai durar ainda não se sabe, mas Afif pretende manter um pé em cada canoa: simultaneamente, exercerá os cargos de vice do governador do tucano Geraldo Alckmin e ministro da Secretaria da Micro e Pequena Empresa da petista Dilma Rousseff. “Sou construtor de pontes”, diz. Para ele, renunciar ao posto no Palácio dos Bandeirantes seria o equivalente a uma cassação, já que foi eleito para o cargo. “Isso tudo é da guerra política do PT com o PSDB, mas eu não estou em guerra com ninguém.”
Leia trechos da entrevista ao site de VEJA.
Como o senhor vai separar a aproximação que Gilberto Kassab (PSD) faz com o PT da sua nomeação? A minha nomeação se deve à biografia e à minha história, minhas votações sempre foram em função da minha história e biografia. Se continuar cumprindo rigorosamente a missão de executar aquilo que sempre preguei, tenho certeza que o eleitor compreende.
O ministro Gilberto Carvalho já fala como se o PSD estivesse na base do governo. O PSD tem sempre ajudado o governo nas votações sem participar, vai continuar não participando e há uma forte tendência em apoiar a reeleição da presidente Dilma. Mas não vai fazê-lo agora, por troca de cargos, mas sim depois, porque o partido passa a ter o direito de participar, já que ajudou a eleger. A posição é cristalina, e meu caso é de escolha pessoal da presidente por afinidade conceitual. Ela acredita nos mesmos pontos que eu em termos de política de pequena empresa. E para isso ela não olhou meu partido, olhou minha biografia e conciliou de eu estar num partido completamente amigável.
O senhor materializa agora aquilo que Kassab disse quando fundou o PSD: que a legenda não seria nem de direita, nem de esquerda, nem de centro? O Kassab falou nem de esquerda, nem de direita. Hoje ele fala que é centro radical (risos). Na verdade esse conceito de direita e esquerda já foi. Apoiar a micro e a pequena empresa é de esquerda ou de direita? Antigamente se dizia que era de direita. Hoje faz parte das políticas sociais. São conceitos tão ultrapassados, que não têm nada a ver com os anseios da sociedade de hoje.
O que motivou o senhor a não renunciar ao cargo de vice-governador? Você quer que eu renuncie a um cargo que fui eleito? Estão querendo me cassar? Eu não fui nomeado, fui eleito. Portanto, a minha renúncia é grave. Como eu vou renunciar? Eu não posso me licenciar, porque o vice é licenciado por natureza. Uma renúncia é um ato muito grave.
Mas o senhor quis ficar no cargo só para não ter de renunciar? O vice não é função ou cargo, é uma expectativa de poder. O vice é um stand by. Está ali para substituir o governador em suas ausências. O governador não pode acumular cargo, sob o risco de perder o mandato. Sobre o vice a legislação não fala, ela é omissa. E aí tem a interpretação de que por ser expectativa de poder, não está impedido de acumular outra função pública. Não há impedimento, do ponto de vista legal.
A renúncia não evitaria esse desgaste de ter uma apuração na Comissão de Ética da Presidência, pedido de cassação na Assembleia Legislativa de SP… Isso tudo é da guerra política do PT com o PSDB, mas eu não estou em guerra com ninguém. Estou trabalhando para o meu estado e para o meu país. Eu sou e honro o PSD, sou construtor de pontes.
O senhor tem de abrir mão de uma das remunerações. Qual será? Acabei de entregar, porque tinha de fazer na véspera da nomeação. Recebo só do cargo federal [26 700 reais]. E entreguei ao governador Geraldo Alckmin a carta pedindo exoneração da presidência do Conselho das Parcerias Público-Privadas do estado.
O senhor iria tentar, mesmo informalmente, combinar as datas de viagens ao exterior com as do governador para não ter de assumir? Isso é conversa. Estou muito à vontade, porque o Geraldo raramente viaja. Ele gosta de estar no comando. Viagem é exceção, não regra. E quando isso acontecer nós vamos administrar de forma tripartite. Não estou aqui para criar problema nem para ele nem para a Dilma. Para eu assumir cargo, tenho de renunciar temporariamente ao ministério. Então renuncio por três dias e sou renomeado, para poder cumprir a missão constitucional.
O senhor se ressente das críticas de um partido próximo e de um governo do qual fez parte? Não, eu compreendo. São todos meus queridos amigos, meus companheiros. Nenhum me fez crítica pessoal. O Alberto Goldman (PSDB), como vice-governador do José Serra (PSDB), acumulou a Secretaria de Desenvolvimento e não pode criticar. Ele conhece a lei e renunciava quando o Serra viajava. O Aloysio Nunes arrasou a história dos ministérios, mas fez questão de ressalvar a minha pessoa.
Que cara o senhor pretende dar ao novo ministério? Será uma secretaria muito enxuta, porque é uma secretaria de articulação e formulação, não de execução. Para isso, temos uma das mais bem aparelhadas estruturas do Brasil, o Sebrae. Ele tem capilaridade, mas carece de um órgão formulador. Esse é um ministério de mais verbo do que verba. Falam em 7 milhões de reais [de orçamento], o que para mim é o suficiente para ter uma estrutura enxuta e eficaz.
Qual será a política nacional prioritária? A curto prazo, é uma missão que o ministério vai receber da presidenta: desburocratização de sistemas que afetam gravemente o ambiente de negócios do micro e do pequeno empresário. No Brasil, para cada um que quer empreender tem vinte para atrapalhar. Isso é traduzido principalmente no tempo de abertura e fechamento de empresas.
Quem o senhor vai trazer para a equipe, até para evitar o aparelhamento que sempre criticou? Será absolutamente técnico. Eu só estou trazendo três técnicos para a cabeça do sistema. Um será o secretário-executivo, vulgo vice-ministro, o diretor de desenvolvimento e o diretor de desburocratização. Não vou anunciar os nomes agora, porque fazem parte da máquina estadual e municipal e têm prática e visão do que deve ser feito.
O senhor não se candidatará a nada em 2014? Não me candidatarei porque estou na [aposentadoria] compulsória (risos). Setenta anos é a compulsória. Tenho que abrir espaço para a nova geração: Kassab, Eduardo Campos (PSB), Aécio Neves (PSDB). Essa é a nova geração, a turma que está no jogo, a gente tem de saber chegar a isso.
Qual seu sonho político? Meu sonho é realizar intensamente e com muito entusiasmo a oportunidade que a presidente está me dando. E que começa nesta quinta-feira.
A aliança pela reeleição de Dilma é fato consumado no PSD? Majoritariamente. A gente sente isso no partido. Nos estados tem de acomodar e respeitar as situações locais.
O senhor acha que o PSD deve ter candidato próprio ao governo de São Paulo? A diretriz geral que vale para São Paulo é manter ou ampliar a bancada federal, porque ela determina o tempo de TV, que é ouro para qualquer campanha. Para isso, tem de lançar o maior número de candidatos majoritários com viabilidade nos estados. Se a sua viabilidade é menor, busque uma composição. O nome natural é o Gilberto Kassab a candidato majoritário – leia-se, governador, vice-governador e senador.
O PSD, no caso o Kassab, poderia compor com o governador Geraldo Alckmin? Vou apenas relatar um fato que ouvi. Quando no fim de 2012 fomos cumprimentar o governador no Natal, ouvi textualmente o Gilberto dizer para ele: ‘Não tenho nenhuma mágoa de passado’. E deram um aperto de mãos. Em política, você tem de ser pragmático e raciocinar com a cabeça. Não com o fígado.