Na próxima semana, o secretário do Emprego e das Relações do Trabalho do Estado de São Paulo, Guilherme Afif Domingos, vai propor ao Ministério do Trabalho um projeto emergencial para atenuar o impacto da crise no emprego formal. O plano prevê o uso de recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) para conceder um benefício semelhante ao seguro-desemprego ao trabalhador, só que sem a necessidade de demissão. Isto é, a empresa em dificuldade poderia suspender temporariamente o contrato de trabalho. O prazo de recebimento do auxílio seria dez meses, o dobro do previsto no seguro-desemprego atual. A seguir, os principais trechos da entrevista.
Qual a sua proposta para atenuar os riscos de desemprego diante da crise econômica?
Eu chamo a proposta de Projeto Travessia, pois são medidas para um período de ajuste da economia. Hoje todas as medidas anunciadas no plano federal e estadual são de socorro à falta de crédito. O diagnóstico é que a falta de crédito travou o consumo. Mas percebemos que há um fator a mais, e que é preponderante: medo de perder o emprego. O crédito está voltando, mas o consumidor não está comprando. O desemprego não é uma situação presente, mas está na cabeça do consumidor. Por isso, temos de tomar medidas no âmbito do emprego.
No que consiste esse projeto?
Existe o FAT, que é um fundo federal. Aprendi com o meu avô que se deve usar o dinheiro ganho nas horas fáceis em horas difíceis. O que é o FAT senão recursos acumulados pela força do emprego para que, num momento de desemprego, possa ser usado? Hoje o seguro-desemprego é usado para o pagamento de uma quantia entre três e cinco meses após a demissão. A minha proposta é criar um plano emergencial, por um prazo de um ano, de seguro-desemprego. O projeto prevê que o trabalhador receba esse benefício sem necessidade de demissão. Basta a empresa suspender temporariamente o contrato de trabalho. O prazo de recebimento do auxílio seria de dez meses. Pelo lado da empresa, ela não teria os custos da demissão nem perderia o profissional.
Quem vai prover esse benefício e de quanto ele será?
Os recursos virão do FAT. O trabalhador vai receber o limite do FAT, que é de RS 700 por mês. Dentro das mesmas regras do seguro-desemprego, estou propondo um programa emergencial para evitar a demissão no caso de a empresa estar em situação crítica de perda de faturamento.
Como a empresa vai comprovar a situação crítica?
Cabe ao sindicato acompanhar a negociação.
Seria válida para todas as empresas privadas, de todos os portes e setores?
Sim, sem discriminação para o mercado formal do emprego. É o que vale hoje para o seguro-desemprego.
Quando será feita a proposta e para qual órgão?
Vamos propor esse plano emergencial para o Ministério do Trabalho até terça-feira da próxima semana. A intenção é que esse plano emergencial seja feito por meio de medida provisória.
Esse projeto tem algo de inconstitucional?
Não, absolutamente. Até porque ele não altera regras, mas estabelece condições.
Qual seria a parte do governo e da empresa nesse projeto?
A parte do governo é o uso dos recursos do FAT e da empresa, a manutenção de um seguro-saúde, por exemplo.
Há recurso do FAT suficiente?
Sim. Hoje o FAT usa para o seguro-desemprego R$ 13 bilhões por ano. O patrimônio do FAT está em R$ 174 bilhões. Com esse projeto, o gasto com seguro-desemprego poderia dobrar. É bem menos do que estão injetando nas operações financeiras e o efeito social multiplicador é muito grande.
De quem foi a ideia?
A ideia nasceu de conversas com funcionários da secretaria que foram líderes sindicais.
O trabalhador no período da suspensão do contrato fica em casa?
Não. Vamos desenvolver programas especiais de qualificação para esses profissionais.
O recebimento do benefício está vinculado à volta à escola?
Não. A qualificação é opcional e destina-se a criar um vínculo com o trabalhador parado.
Publicado no O Estado de S.Paulo em 03/12/08