Há mais de 100 anos, Tobias Barreto indagava: “O Estado procura saber se os meninos estudam. Por que não procura saber antes se eles comem?”
A pergunta continua mais válida do que nunca e no Nordeste é obrigatória. Só que o conceito de fome aqui é muito mais elástico do que no resto do País. Pode ser estendido aos campos da habitação, do transporte, do meio ambiente, da segurança pública, da saúde, do saneamento básico e de muitas outras áreas, limites que excedem o natural espaço de um artigo de jornal.
Se vivo fosse, o velho mestre Tobias Barreto certamente aconselharia “repassar o Nordeste a limpo” e insistiria no combate à mais premente das carências da Região desde os tempos do império: a de justiça social.
Não há mais lugar para meras promessas na busca de melhores condições de vida para milhões de brasileiros radicados na Região, que o resto do país aprendeu a ver como “problema”, como “déficit”. Conceitos amplificados ao longo do tempo pela ignorância de que todo o peso das injustiças que essa população sofre é produto de problemas mal resolvidos no passado, acumulados em proporções geométricas no presente e que prometem explodir no futuro caso não tenham como antídoto uma plataforma liberal. A revolução está às nossas portas e a resposta dos injustiçados à indiferença política poderá exceder às nossas mais pessimistas expectativas, se nada for feito para restabelecer a confiança popular e acabar com a diáspora que tanto tem desagregado núcleos familiares nordestinos. A convivência espúria de um Brasilì minoritário, mas farto, arrogante e corrupto, com o País real — miserável, oprimido — tende, cada vez mais, a destruir o tecido moral que um dia classificou o brasileiro médio como “homem cordial” por excelência.
É nesse contexto que se impõe a plataforma liberal como alguma coisa a mais do que mera promessa, antes realidade palpável que viabilizará o Brasil em duas gerações. A questão é: a sociedade estará disposta a, mais uma vez, tolerar o presente e investir no futuro? Os teóricos costumam afirmar que cada geração deve resolver seus problemas porque a longo prazo estaremos todos mortos. Os liberais perscrutando um pouco a alma brasileira têm a certeza de que terão um voto de confiança da população porque a desafiam com sacrifícios e trabalho com vistas a um futuro decente para seus filhos e netos enquanto outros só insistem na miragem do paraíso aqui e agora num momento em que é notória a insolvência do País.
O que oferecemos é um programa de Governo que pensa, antes de tudo, nas populações vilipendiadas para as quais está previsto um plano de 18 meses com grandes pacotes de pequenas obras para abrigar na dignidade do trabalho, milhões de pessoas que sem tal providência morreram à míngua enquanto devolvemos o País aos eixos. Junto com o trabalho, cestas básicas de alimentos e remédios, os únicos subsídios permitidos pelo credo liberal no Brasil que governaremos. Superada essa fase crítica, envolveremos o País nas três revoluções que desenharão o futuro deste quase continente: a verde, a urbana e a educacional-tecnológica, atacando de frente aquelas carências multisseculares que o tempo só agrava para as maiores, enquanto uns poucos se locupletam no ócio das intermediações e na utilização de fundos públicos por gerações e gerações. Para o Nordeste é fundamental a revolução verde preconizada já que ela significa preferência para os projetos de irrigação e para o fomento da agroindústria, que desconcentrará as grandes cidades, fonte maior das grandes mazelas contemporâneas brasileiras.
Temos, efetivamente, um plano que só precisa de sinal verde do povo para ser aplicado a partir de 15 de Novembro próximo. Nele estão contemplados a reformulação da Sudene, do Banco do Nordeste e do DNOCS e tantos outros organismos que criados para melhorar o padrão de vida dos nordestinos, na maior parte do tempo só fizeram enriquecer alguns em detrimento da maioria. A Sudene deixará de ser a ilha da fantasia de políticos eleitoreiros e dos intermediários, que a desviaram de suas verdadeiras funções, e será devolvida ao corpo técnico que sofreu, sem nada poder opor, a mudança espúria de sua rota inicial. Da mesma forma que o Banco do Nordeste que voltará a sua condição de agência de fomento ao desenvolvimento da Região em vez de banco comercial, condição para a qual é incompetente e que nada tem a ver com as motivações que o criaram um dia. Aos sudeneiros – classificação genérica que damos aos cartéis regionais que botaram a perder algumas das mais felizes iniciativas para reverter a miséria regional, apenas porque dispunham de canais políticos “competentes”-, portanto, deixamos um recado: a plataforma liberal vai ser implantada para valer porque em nosso Governo, a qualquer pretexto, ninguém estará acima da lei.
Publicado no jornal O Povo, de Fortaleza em 1989