Mais uma vez o Conselho Monetário Nacional se reúne para discutir medidas para refrear o consumo, medidas que deram origem a um novo “pacote” do Banco Central impondo restrições a atividades privadas legalmente constituídas. A grande ironia é que, enquanto se procura conter o consumo dos cidadãos, os gastos do governo continuam crescendo, consumindo todo o aumento da receita propiciado pela retomada da economia.
Este terceiro “pacote” anticonsumo do Plano Real veio com o propósito de reduzir a procura excessiva por automóveis e impedir mecanismos informais de crédito, que estariam levando o brasileiro a consumir, consumir, consumir…
Será que o brasileiro está consumindo tanto assim? Dados disponíveis no Sebrae mostram que as vendas do comércio estão em níveis normais para o período e alguns setores, inclusive, registram movimento fraco.
Essa não é, porém, a grande questão. O grave é que o novo “pacote” não passa de mais uma interferência do Estado na economia privada, que tem sido constante, e da qual discordamos pelos resultados negativos que acarreta, gerando incertezas e insegurança entre os agentes econômicos.
Não há quem resista a tantas mudanças nas regras do jogo. Não há como planejar investimentos na produção nem como garantir aumento da oferta de empregos, a grande meta social do governo.
A alegação é sempre a mesma: o aumento dos níveis de consumo pressiona a inflação. Ocorre, no entanto, que os “pacotes” acabam, no geral, desestimulando mais ainda a oferta do que contendo o consumo. Não há qualquer incentivo à ampliação da produção. Os juros, ao contrário, estão em níveis insuportáveis e fechadas todas as linhas de crédito para as micro e pequenas empresas. Os empresários continuam a produzir, à vender e a dar empregos porque são teimosos e acreditam em sua capacidade de enfrentar e superar obstáculos.
Que ninguém se engane: as medidas de restrição ao consumo baixadas pelo governo serão superadas na prática pela criatividade do setor produtivo, que é maior do que a imaginação intervencionista da burocracia. Só para dar um exemplo dessa criatividade, vejamos o que aconteceu no caso do consórcio de veículos. A redução do prazo de 50 meses para 12 meses, determinada pelo “pacote” de outubro do ano passado, surtiu efeito contrário ao esperado: o número de consorciados foi mantido e os grupos aumentaram.
O que nos surpreende é ver que um governo com um discurso tão moderno adote práticas tão antigas. Ainda esperamos, no entanto, que ele se volte para si mesmo e corte drasticamente suas próprias despesas, deixando o setor privado produzir e o cidadão consumir.
Publicado no jornal O Dia, do Rio de Janeiro, em 03/03/95