Embora tenha se constituído em um grande avanço, o artigo 179 da Constituição ficou incompleto. Ele determina o tratamento diferenciado às micro e pequenas empresas nos campos tributário, creditício, administrativo, previdenciário e jurídico. Mas a área trabalhista ficou de fora, devido às enormes pressões contrárias patrocinadas pelos grandes sindicatos.
A Constituinte de 88 reforçou o Estado patrimonialista e corporativista, um modelo falido, incompatível com a abertura econômica que o país está vivendo, e que deve ser transformado através das reformas estruturais previstas pela revisão constitucional. É urgente, portanto, rever a atual legislação concebida para uma elite, para monopólios e oligopólios, que empurrou para a informalidade 57% da força brasileira de trabalho.
Ninguém duvida hoje da importância das micro e pequenas empresas para o desenvolvimento do país. Os números falam por si: elas representam um universo de 4 milhões de estabelecimentos agrícolas, industriais, comerciais e de prestação de serviços, responsáveis por 48% do total da produção nacional, 42% dos salários pagos, 70% da oferta de mão-de-obra e cerca de 30% do Produto Interno Bruto.
Num país ainda carente de poupança interna e com grandes dificuldades – impostas pela própria Constituição – para atrair investimentos estrangeiros, a micro e pequena empresa são a forma mais barata de criar emprego. Para gerar um único emprego numa grande empresa são necessários investimentos de 80 a 90 mil dólares. Com um quarto destes recursos cria-se um emprego numa pequena empresa. Para a micro, a exigência de investimentos é ainda menor.
Outro fator amplia a importância dos pequenos negócios. Hoje, desemprego estrutural cresceu com a robotização, a informatização, a terceirização e o aumento dos índices de produtividade. Assim, uma grande empresa pode realizar grandes investimentos para expandir sua linha de produção sem criar empregos. São as micro e pequenas empresas que dão emprego a um contingente cada vez maior de trabalhadores expulsos do mercado de trabalho dos grandes grupos empresariais.
O aprimoramento do artigo 179 da Constituição torna-se, portanto, imperativo para que micro e pequenas empresas tenham condições de cumprir sua grande função social e alavancar o desenvolvimento do país. A revisão da questão trabalhista, resguardados os direitos fundamentais e as legítimas conquistas dos trabalhadores, é fundamental para oxigenar o setor, que exige um tratamento diferenciado em relação às grandes corporações.
Nossa proposta no campo trabalhista é ousada. Queremos dar ao trabalhador das micro e pequenas empresas com até cinco empregados o mesmo tratamento dos empregados domésticos, acrescendo-se, aos seus inalienáveis direitos, o FGTS – Fundo de Garantia por Tempo de Serviço. Com esta mudança, poderemos combater a sonegação fiscal e a economia informal, aumentar a arrecadação tributária, fortalecer a Previdência Social, reduzir o déficit público e criar milhares de empregos.
Estamos, também, reivindicando que as micro e pequenas empresas sejam desobrigadas de pagar o piso salarial, exigência suportável apenas para as grandes e médias empresas. Defendemos o acordo individual, em contraposição ao acordo coletivo de trabalho para estas empresas que, geralmente, têm caráter familiar e forte relacionamento entre empregador e empregados. Queremos, por fim, acabar com as obrigações de Folha de Pagamento, RAIS – Relação Anual de Informações Sociais e outros recolhimentos e tributos que não sejam o salário do trabalhador e seu ingresso na Previdência Social.
O que pretendemos, em síntese, é aproximar o Brasil Real do Brasil Legal. Não queremos impor nada, mas discutir com a sociedade, principalmente com os milhões de micro e pequenos empresários, as reformas capazes de criar condições para o desenvolvimento harmônico e sustentado do País. O Sebrae e as Associações Comerciais promoverão seminários de divulgação da nova proposta e, até o final do mês de maio, realizaremos, dentro do Congresso Nacional, o V Congresso Brasileiro de Pequenas Empresas. Neste momento, levaremos, em nome da sociedade brasileira, uma proposta definitiva a Brasília, cobrando de nossos representantes no Legislativo uma posição a nosso favor.
Publicado no Jornal do Brasil em 27/02/95