Apresentação do livro: “Em busca da melhor cidade – Análise, ideias e soluções para os municípios do Brasil”
Por Guilherme Afif
Não existe federalismo forte com município fraco. A concentração exagerada de recursos no Poder Central, associada à distribuição desequilibrada de tarefas, conspira contra a racionalidade administrativa, a alocação eficiente dos investimentos e a capacidade de cobrança da sociedade sobre o destino dos impostos que paga. A conta não fecha.
Não há contorcionismo intelectual que explique este fato: quem faz mais fica com menos. “Tão perto dos problemas, tão longe dos recursos” poderia ser o lema dos municípios e estados brasileiros. Responsáveis pela prestação da maior parte dos serviços públicos considerados mais importantes pela população – saúde, educação e segurança pública, para citar apenas três – municípios e estados enfrentam, com imensas dificuldades financeiras, o desafio de espalhar bem estar para milhões e milhões de brasileiros em todos os cantos do país.
A vida dos prefeitos está sempre cheia de demandas; o cofre, sempre vazio de dinheiro. Enquanto os países mais desenvolvidos se caracterizam pela descentralização e ação conjunta dos entes federados, no Brasil vivemos o federalismo do “você que se vire”. Todos os anos assistimos, até com um certo enfado, a uma ou mais “Marcha dos Prefeitos a Brasília”, que bem poderia ser chamada de “passeata do pires na mão”. O que são essas marchas? Administradores municipais reivindicando recursos que se acumulam nas mãos da União, que saem das cidades e não voltam mais. Ou, quando voltam, são gravadas por um injustificável e revoltante “pedágio burocrático político”.
O Brasil é um país gigantesco e muito diversificado. Dados recentes indicam que 36% dos brasileiros vivem nos mais de 4.500 municípios com menos de 50 mil habitantes, enquanto cerca de 40% da população se espreme nas grandes regiões metropolitanas, que representam 1,9% do nosso território. Ora, o poder central não é – aliás, está bem longe de ser – onisciente. Quem entende os problemas locais são as autoridades locais. Por que, então, não aquinhoá-las com mais recursos?
Depois da Constituição de 1988, a União lançou mão de um truque. A nossa Carta Magna estabelece que os Fundos de Participação dos Estados e Municípios são formados pelos impostos federais. Pois bem, ao longo do tempo, Brasília foi criando uma série de contribuições – Cofins e Cide são dois exemplos – que passaram a ser excluídas do bolo a ser dividido. Os números são definitivos: em 1988, as receitas da União eram representadas por 80,27% de impostos e 19,73% de contribuições. Em 2011, as contribuições já representavam 48,5%. Fica com mais do que deveria e faz menos do que lhe é dever realizar. O caso da educação superior é emblemático. No Brasil, apenas 25% dos alunos matriculados no ensino superior estão na rede pública. São aproximadamente 1.200.000 estudantes. E, apesar de toda a concentração de recursos e as responsabilidades constitucionais que recaem sobre a União no que diz respeito ao ensino superior, a maior parte desses alunos – 56% – está nas universidades e faculdades das redes estaduais e municipais. E isso para não falar na gigantesca rede de ensino fundamental e médio, totalmente da alçada dos governos subnacionais.