O presidente do Sebrae Nacional esteve em Santa Catarina para uma Audiência Pública sobre o Projeto de Lei Complementar (PLC) 341/2017, que altera o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte. O PLC foi apresentando por um catarinense, o deputado federal Jorginho Mello (PR), presidente da Frente da Micro e Pequena Empresa do Congresso Nacional e com quem Afif Domingos mantém conversas constantes para buscar soluções legais que possam incentivar e proteger o empreendedorismo. A Coluna Pelo Estado obteve uma entrevista exclusiva com o líder empresarial, que preside o Sebrae desde outubro de 2015. Ele também foi ministro-chefe da Secretaria da Micro e Pequena Empresa da Presidência da República (maio de 2013 a setembro de 2015), período em que patrocinou uma das mais profundas revisões do Simples, viabilizando a sua universalização para os pequenos negócios de todas as atividades. Antes disso, no Conselho Deliberativo do Sebrae (1990 a 1994), foi o responsável pela mobilização que resultou na criação do próprio Simples e no novo Estatuto das Micro e Pequenas Empresas. Afif já concorreu à presidência da República, em 1989, quando obteve 3,2 milhões de votos. Questionado se vai se candidatar em 2018, respondeu: “Tudo depende das oportunidades”.
[Pelo Estado] – O Sebrae está completando 45 anos em 2017. Em que cenário o serviço surgiu e que dimensão tem hoje? Afif Domingos – Bem, o Se-brae surgiu há 45 anos na onda dos bancos de desenvolvimento. Existia um sistema pelo ministério do Planejamento, que tinha o “BNDE”, sem o “S” ainda, corno banco de desenvolvimento e os bancos estatuais de desenvolvimento. Cada estado tinha um que compunha este núcleo de investimento de longo prazo para as empresas. Como as pequenas tinham dificuldades de ter acesso a este sistema, o Sebrae foi criado como autarquia para facilitar que as micro, pequenas e médias empresas pudessem ter um crédito orientado, um crédito assistido para poder ter projetos que chegassem ao banco com dimensão de desenvolvimento.
Depois, nos anos 1990, é que se deu urna estrutura mais dinâmica ao Sebrae, transformando-o em serviço social autônomo com arrecadação garantida, própria, por meio das contribuições sociais e que deveria continuar com sua missão anterior, que era exatamente orientar as pequenas empresas no seu processo de desenvolvimento e de acesso ao crédito. O problema é que, destes tempos para cá, crédito foi urna coisa que não aconteceu para as micro e pequenas empresas até porque o sistema de bancos de desenvolvimento praticamente desapareceu, ficando o BNDES no seu papel de oferecer recursos para os campeões nacionais, sem conseguir chegar ao universo dos pequenos. Agora é que nós estamos retomando esta missão e esperamos que junto com o próprio BNDES, seus agentes de desenvolvimento e de distribuição de recursos, nós possamos cumprir esta missão histórica de 45 anos atrás.
[PE] – Há alguma negociação com o BNDES para abrir linhas voltadas para esses empreendimentos?
Afif– Sim, agora, com a nova gestão, do doutor Paulo Rabelo de Castro, com quem temos ótima relação, e depois dos escândalos dos gigantes (grandes empresas), o BNDES finalmente entendeu que é hora de abrir linhas de crédito para os micro e pequenos empreendimentos. Mas, para isso, nós temos de furar o bloqueio dos bancos que, por serem grandes demais, têm tido dificuldades em emprestar recursos para os pequenos empresários. Atualmente, 83% das empresas de pequeno porte não têm acesso a nenhuma linha de crédito.
[PE] – Qual a importância desse segmento, hoje, para a economia brasileira?
Afif– Simplesmente ele representa 98% do número de empresas existentes no país, 52% dos empregos e 27% do PIB nacional. Mas, nos últimos 10 anos, quem gerou 10 milhões de vagas no mercado foram as micro e pequenas empresas, enquanto as grandes empresas desempregaram 1 milhão e meio de pessoas, porque o desemprego estrutural atinge exatamente as grandes, que hoje usam moderna tecnologia e automação para substituir mão de obra. A pequena empresa é a que continua intensiva de mão de obra.
[PE] – O que o senhor destaca como mais importante do PLC 341/2017
Afif– A 341 é urna lei viva, que vem sendo aperfeiçoada. E estamos nessa cruzada de aperfeiçoamento porque a última modificação entra em vigor em janeiro de 2018, que é o Crescer sem Medo. Eu destaco a criação da Empresa Simples de Crédito, que é o crédito lá no município, à disposição do pequeno empresário, do cidadão que quer emprestar para ele diretamente, sem intermediação. O segundo ponto é a correção automática das tabelas de enquadramento do Simples porque passa ano, vem ano, chega a inflação come o seu limite e ela passa a pagar mais imposto, não porque cresceu e sim porque a inflação assim gerou esta necessidade. Acredito na firme intenção de se apressar a votação, porque isso significa promover a geração de emprego e renda. Aliás, não existe política social sem emprego e renda.
[PE] – A Frente Parlamentar Mista das Micro e Pequenas
Empresas tem força política para convencer o governo da importância desses avanços? Afif– Eu quero lembrar que todas as modificações que têm sido feitas na legislação nascem do Legislativo e têm sido aprovadas por unanimidade. E eu não tenho medo de afirmar que nós, infelizmente, acabamos tendo de enfrentar o Executivo em todas as modificações, porque a visão da área econômica do governo é, em primeiro lugar, olhar as grandes empresas e, em segundo, olhar a arrecadação. E insiste em dizer que o Simples é uma renúncia fiscal, o que é uma grande heresia, porque o Simples é, na verdade, um regime constitucional especial.
[PE] – De que forma as mudanças propostas vão impactar o segmento atendido pelo Sebrae?
Afif– Sem dúvida, com o Crescer Sem Medo, e com as tabelas corrigidas, nós vamos ter um imposto mais justo para quem quer crescer. Por isso, o nome do programa.
[PE] – A política econômica brasileira em algum momento já deu atenção às empresas de pequeno porte? O que precisa mudar?
Afif– Olha, a política que nasce das áreas econômicas não dá atenção às empresas de pequeno porte. Eles olham aqueles que são os grandes recolhedores de tributo. E, se
possível, os protege concorrencialmente para “comer” os pequenos. Um exemplo disso é a própria substituição tributária, um instrumento que veio para poder dar uma puxada de tapete no Simples, quando ele foi criado. Mas devo dizer que muitos dos nossos avanços foram apoiados por pessoas do governo, tanto na presidência da República como em outras áreas, mas sempre em confronto com a área econômica porque ela nunca quis olhar a pequena empresa como importante pro desenvolvimento do país. E preciso colocar o Brasil real próximo do Brasil legal.
[PE] – Como o senhor avalia o momento atual do pais?
Afif– Estamos passando por urna catarse, o que é muito bom. Quanto mais coisas aflorarem, mais vai mostrar como eram os subterrâneos da política do Brasil. Isso tem que ser depurado mais e mais. Esse é o caminho da mudança e da renovação. Se não vier no curto, virá no médio prazo, até porque a própria população fará os ajustes a cada eleição.
[PE] – O senhor tem planos de se candidatar em 2018?
Afif– Por enquanto continuo trabalhando na micro e pequena empresa. Tudo depende das oportunidades, mas nós ainda não as enxergamos. Além disso, ainda sequer foram votadas as modificações da Lei Eleitoral.
Fonte: Jornal Hora do Sul – SC