O Banco Central já se posicionou a favor da criação da Empresa Simples de Crédito (ESC), um tipo de agente financeiro proposto no ano passado e neste ano, no Congresso Nacional, em projetos de atualização da Lei Geral da Micro e Pequena Empresa.
Quem anunciou a nova posição do BC em relação ao tema foi o presidente do Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), Guilherme Afif Domingos, durante o IV Encontro dos Municípios com o Desenvolvimento Sustentável (EMDS), promovido pela Frente Nacioanl de Prefeitos (FNP), que foi realizado de 24 a 28 de abril, no Estádio Mané Garrincha, em Brasília.
“Sim, já tem um grupo de trabalho que é favorável a isso”, disse ao DCI o presidente do Sebrae, citando que reuniões foram realizadas sobre a proposta, inclusive com a participação do presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn.
No ano passado, a proposta foi vetada pelo presidente Michel Temer com a orientação do BC. “Eles vetaram porque estavam assustados com a novidade: ‘Precisamos controlar’. Mas controlar o quê? O dinheiro é do cara. Você precisa controlar é poupança pública. Aí começaram a entender, e nós estamos caminhando para um entendimento para consagrar agora no Congresso uma proposta que seja aceita”.
No IV EMDS, Afif defendeu a proposta porque vai gerar uma nova concorrência com o sistema bancário brasileiro, considerado por ele como um dos mais concenrtados do mundo. “Nos Estados Unidos, você tem 8.000 bancos. Aqui, o sistema bancário é concentrado em cinco grandes bancos”, comparou.
A criação da ESC é uma das novidades previstas no projeto de lei complementar (PLP) nº 341/17, apresentado em fevereiro pela Frente Parlamentar Mista da Micro e Pequena Empresa, uma das maiores bancadas do Congresso, com 320 deputados e 32 senadores.
Foi apresentado pelo presidente da Frente, deputado federal Jorginho Mello (PR-SC). Na maior parte, o texto recupera itens vetados pelo governo no chamado projeto “Crescer Sem Medo“, a mais recente revisão da Lei Geral da Micro e Pequena Empresa, a Lei Complementar nº 155/2016, sancionada em outubro do ano passado pelo presidente Michel Temer.
De acordo com a proposta vetada, a ESC teria atuação no próprio município da sede e em municípios limítrofes para realizar operações de empréstimo, financiamento e desconto de títulos de crédito perante pessoas jurídicas, exclusivamente com recursos próprios.
A ESC seria remunerada somente pela taxa de juros cobrada, não se admitindo a incidência de quaisquer outros encargos, mesmo sob a forma de tarifas.
Na mensagem dos vetos, o presidente Temer justificou que as atividades da ESC “mantêm forte similaridade às já desenvolvidas pela Sociedade de Crédito ao Microempreendedor e à Empresa de Pequeno Porte”.
Também argumentou que a estrutura proposta não guarda consonância com as atribuições dos órgãos normativos e supervisores do sistema financeiro nem oferece os elementos imprescindíveis e essenciais à governança, transparência e controle das instituições destinatárias do benefício tributário no âmbito do Simples Nacional.
Por fim,a mensagem de veto apontou que a ESC estava fora do tema da lei complementar, destinada a regular o tratamento tributário diferenciado para as microempresas e para as empresas de pequeno porte.
Ainda assim, a lei sancionada em 2016 trouxe importantes novidades para os pequenos negócios. Por exemplo, prevê o aumento, a partir de janeiro de 2018, do teto de faturamento anual das empresas do Simples, de R$ 3,6 milhões para R$ 4,8 milhões; e do microempreendedor individual, de R$ 60 mil para R$ 81 mil.
Segue a entrevista com o presidente do Sebrae, em que ele fala também sobre a lei da terceirização, o projeto da reforma trabalhista já aprovado na Câmara e sobre reforma tributária:
DCI: A Empresa Simples de Crédito sai agora?
Afif: Acredito que sim.
DCI: O que houve de novidades nos entendimentos com o Banco Central?
Afif: Nós falamos: “quais os controles que vocês querem?”
DCI: Isso é recente?
Afif: Nós estamos em reunião, nós estamos em um grupo de trabalho, com o Ilan (Ilan Goldfajn, o presidente do Banco Central) .
DCI: Mas eles [do Banco Central] vetaram no ano passado.
Afif: Eles vetaram porque estavam assustados com a novidade: “Precisamos controlar”. Mas controlar o quê? O dinheiro é do cara. Você precisa controlar é poupança pública. Aí começaram a entender, e nós estamos caminhando para um entendimento para consagrar agora no Congresso uma proposta que seja aceita.
DCI: Seria parte da nova atualização da Lei Geral da Micro e Pequena Empresa que está em tramitação no Congresso?
Afif: Ela simplesmente destaca quais são os cuidados e quais são os controles.
DCI: Mas vai ser um projeto à parte?
Afif: Você pode até destacar, se for para um projeto poder andar mais rápido.
DCI: Mas já está negociado que haja um sinal verde do Banco Central.
Afif: Eles estão trabalhando.
DCI: Eles já são favoráveis?
Afif: Sim, já tem um grupo de trabalho favorável a isso.
DCI: Presidente o que que senhor achou da reforma trabalhista ?
Afif: Vamos aguardar agora a sua confirmação, ou seja, no Senado. Mas eu achei que nós avançamos em pontos importantes. Eu acho que o principal é o fortalecimento dos sindicatos reais, os autênticos. E não o sindicato de gaveta. Porque, no momento em que você deu força ao negociado sobre o legislado, você automaticamente dá força ao sindicato efetivamente representativo. Ele passa a ter o poder de negociar, mesmo aquilo que não esteja dentro da lei. Ele pode modificar. Então, eu acho que esse é o ponto principal.
DCI: Isso afeta também os sindicatos das empresas, que também irão perder o imposto sindical?
Afif: Mas tem que ser autêntico. Claro, claro, você vai dar força ao sistema de representação não coercitivamente, mas espontaneamente. Ele passar a ter importância pelo que ele representa e não pelo volume de dinheiro que ele arrecada sem compromisso com a base. Hoje, quando você coloca que a contribuição é espontânea, ou seja, ela tem que ser autorizada, logicamente aqueles que prestarem o melhor serviço são os que vão efetivamente ser eleitos como representativos.
DCI: E a terceirização, presidente?
Afif: A terceirização já foi, e ela é muito importante, muito importante principalmente para o universo da micro e pequena empresa, porque na terceirização você vai ter grandes oportunidades de evolução e desenvolvimento principalmente na área de tecnologia. Hoje tem muita empresa que têm dificuldade de fazer desenvolvimento devido à burocracia porque a grande empresa é burocrática. Empresa grande tem escala, mas não cria. Quem cria é a cabeça das pessoas. Se a pessoa está dentro de uma empresa, amarrada às normas corporativas, dificilmente ela pode explodir em criação. Então, muitos daqueles que hoje trabalham numa grande empresa vão enxergar oportunidade de ser um fornecedor dela com o desenvolvimento de um sistema de acordo com a prática que ele viu no dia a dia.
DCI: Não há o temor da pejotização [a transformação de assalariados em pessoas jurídicas]?
Afif: Quem está com medo da pejotização é a arrecadação do Estado. Então, toda hora fala em pejotização: “Ah, vamos perder arrecadação do Estado”. Por quê? Estão interessados porque o que tem hoje de chupinha em cima de salário não está escrito. O salário é muito para quem paga e pouco para quem recebe. Tem muito intermediário aí no meio.
DCI: O senhor está defendendo que a reforma tributária continue a manter os benefícios aos pequenos negócios?
Afif: A reforma tributária que precisa ser feita no Brasil é em cima de uma coisa anacrônica chamada ICMS [Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação]. O ICMS é hoje um manicômio tributário, com 27 legislações nos Estados e no Distrito Federal, com 27 regras, 27 inimizades e 27 guerras fiscais. Criou-se o imposto de fronteira [o diferencial de alíquotas estaduais], que é medieval. É o carimbão que você tem que carimbar para passar de um Estado para outro. Isto é anacrônico, isto é uma coisa patológica. Em plena era digital, nós estamos com um sistema medieval. Portanto, a nota fiscal eletrônica é a base para nós começarmos a unificar [o ICMS] em todo o território nacional, com regras únicas. O imposto é do Estado, seja de origem, seja de destino. Mas o cidadão recolhe num ponto só. Emitiu a nota, tem a regra, recolhe naquele ponto, e o sistema automaticamente distribui os recursos para os Estados. E o que é o exemplo disso? O Simples Nacional. O Simples é o exemplo da futura reforma tributária que deve haver no Brasil. O cidadão recolhe em uma base só e distribui. Quem não vai gostar são as corporações fiscais de cada estado que querem ter o direito de gerar a sua própria burocracia.
Fonte: DCI online