O pesadelo do Congresso Nacional

31 de julho de 2013
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As manifestações populares que recentemente agitaram o país foram a primeira onda de um tsunami que já refluiu. No entanto, se não forem apresentadas respostas às demandas inúmeras da sociedade, uma segunda onda se formará. Mais poderosa e mais violenta, cujo saldo, embora imprevisível, trará, sem dúvidas, riscos à democracia, construída a duras penas.

Entendo que a procedência do fermento que fez transbordar a insatisfação popular é de fácil identificação. O cidadão não mais encara como seus representantes os políticos que hoje ocupam cargos no Poder Legislativo. Atesta esse fato a incapacidade de a esmagadora maioria das pessoas recordar em quem votou em 2010.

O fenômeno explicita a separação entre o famoso nós, o povo, contra eles, os políticos. No meio, um buraco negro, que precisa ser preenchido. Se providência nesse sentido não for tomada, o vácuo se ampliará e o Congresso correrá o risco de se tornar instrumento de pressão sobre o Poder Executivo, para que interesses não identificados com os da população sejam atendidos. Será o esgarçamento irremediável do tecido democrático.

Na realidade, a solução para promover a reconciliação do cidadão com o político e a política passa, obrigatoriamente, pela reforma do sistema eleitoral. Ela deve ser promovida para restabelecer o indispensável vínculo com a democracia e as práticas republicanas.

Nesse sentido, posiciono-me como defensor intransigente do voto distrital no Brasil, que, sem a realização, de um plebiscito jamais será introduzido.

A receita para essa reforma fraciona os Estados em distritos, respeitando o contingente parlamentar proporcional à sua população. No caso de São Paulo, por exemplo, o Estado seria dividido em distritos de mais ou menos 300 mil eleitores, sendo eleito apenas o candidato mais votado. Legitimaria a vinculação do candidato aos eleitores de cada distrito.

Essa medida oxigenadora resultaria em uma campanha de custos mais reduzidos, pois o Tribunal Eleitoral forneceria aos candidatos os dados referentes aos eleitores, eliminando os gastos faraônicos hoje despendidos em marketing e comunicação nas campanhas.

Além disso, o novo sistema eleitoral instituiria o instrumento do “recall”, garantindo aos cidadãos uma ferramenta capaz de cassar o mandato de quem não cumprir os compromissos assumidos com a base. Ninguém em sã consciência terá dúvida de que a oferta desse instrumento mudará a história da política brasileira, na medida em que o poder estará nas mãos do eleitor.

É de obviedade cristalina que a instituição do voto distrital representa um pesadelo diuturno aos congressistas, ao tirar-lhes a liberdade de se desvincularem das bases. Atrelam-se às cúpulas. Ao toma lá dá cá. Para essa resistência, o remédio é singelo. A realização do plebiscito com questão única: voto proporcional, que é o sistema atual, ou voto distrital.

A campanha de esclarecimento a anteceder o plebiscito criaria a oportunidade mais do que necessária para a população tomar consciência das modalidades propostas, informar-se sobre o que é política e debater, de maneira concreta, o destino do país. Ela permitiria canalizar a energia das ruas para um debate esclarecedor, inclusive daqueles que pensam que entendem de política.

Trilhar esse caminho evitará que a energia dos movimentos das ruas se perca e deixe de resultar em uma profunda transformação dos usos e costumes cultivados pela representação político-partidária do país, que é, não à toa, o alvo da contestação popular. Patrocinar o plebiscito é deflagrar a necessária reforma política, a mãe de todas as reformas. Porque, depois dela, todas as outras ocorrerão, com maior velocidade e legitimidade.

 

Publicado na Folha de S. Paulo em 30 de julho de 2013

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