A missão da Secretaria é simplificar sempre, diz Afif

15 de julho de 2013
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Há apenas dois meses os empreendedores brasileiros ganharam um forte aliado junto ao governo. Guilherme Afif Domingos, ex-presidente da ACSP e Facesp, assumiu a Secretaria da Micro e Pequena Empresa. Sua missão, como ele mesmo define, é ‘simplificar, sempre’.  A palavra Simples vem do latim, simplex. Significa um, único. E Afif, filiado ao PSD, é certamente conhecido por sua singularidade. Empresário, administrador de empresas e  vice-governador de SP,  exerce sua função de ministro como  crítico contumaz da elevada arrecadação tributária, da burocracia paralisante e da falta de crédito para empreender. Na entrevista abaixo, concedida a 15 rádios do País e transmitida pela NBR, Afif, um dos arquitetos do regime de tributação Simples, do MEI e do Estatuto da Micro Empresa, fala sobre seus planos à frente da nova secretaria criada pela presidente Dilma Rousseff:

Quais os objetivos da Secretaria da Micro e Pequena Empresa (SMPE) da Presidência da República?

Guilherme Afif Domingos – A Secretaria da Micro e Pequena Empresa  tem uma missão: simplificar sempre. O maior inimigo do empreendedor é a burocracia, que é paralisante. Se a gente quer fazer a coisa complicada, é simples, basta não pensar. Por isso, temos que passar o tempo todo pensando em simplificar o simples. É o que estamos fazendo. Primeiro, no campo burocrático. Depois, temos que atuar no campo creditício, porque a grande dificuldade do micro e  empreendedor é ter acesso ao crédito, principalmente para investimento.

O senhor poderia dar um exemplo sobre as dificuldades enfrentadas pelos micro e pequenos empresários?

Afif  – Se uma manicure for a uma loja comprar uma televisão de 50 polegadas, tem crédito em até 60 meses. Mas se for adquirir uma autoclave, equipamento indispensável para esterilizar o material de trabalho dela, é obrigada a pagar a vista. Isso acontece porque o sistema de crédito é todo voltado para bens de consumo,  não de produção. Esse é um ponto fundamental. A criação da SMPE pela presidenta Dilma Rousseff veio exatamente ao encontro da necessidade de ter alguém dentro do governo pensando simples o tempo todo. Essa é a nossa missão.

A capacitação dos micro e pequenos empresários é um obstáculo a ser vencido. Qual a orientação da Secretaria?

Afif  – O grande e o pequeno empreendimento têm características totalmente diferentes. Em relação ao pequeno, esse depende muito da força criadora do empreendedor. O que torna a capacitação um ponto fundamental.  É necessário reconhecer que o Brasil dispõe de uma instituição extremamente importante, o Sebrae, que nasceu com a tarefa de garantir qualificação para o pequeno empreendedor no campo gerencial. Mas esse aspecto tem que estar sempre acoplado ao crédito, porque em relação a essa questão o  microempresário é ainda muito carente.

O Brasil convive com uma pesada herança cartorial. Qual a receita para acabar com as dificuldades enfrentadas por quem deseja abrir uma empresa ou  encerrá-la?

Afif  – Quando se fala na burocracia, que acarreta altíssimos custos tanto para a abertura quanto para a baixa de empresas, coloca-se o dedo na ferida. Para enfrentar essa dificuldade, dispomos da Redesim, a rede de simplificação do processo de abertura e fechamento de empresas. Com a criação da Secretaria, a presidenta Dilma alocou na Pasta o Departamento Nacional de Registro e Comércio, onde estão as juntas comerciais que registram o nascimento e a morte das empresas.

O problema, então, seria solucionar as dificuldades existentes para se abri e fechar empresas?

Afif – Na verdade, o problema não se restringe a abrir empresas. O grave problema que existe é fechar. A Secretaria tem o compromisso de atacar e resolver essa questão. Existe uma estatística do Banco Mundial, o Doing Business, que coloca o Brasil em uma posição vergonhosa em matéria de tempo de abertura e fechamento de empresas. Nós temos que mudar. E a saída é o sistema digital, pela criação da janela única, com a construção de um portal de entrada para registro e baixa.

Como esse mecanismo solucionaria as dificuldades burocráticas hoje?

Afif  – Esse novo mecanismo estará integrado à Fazenda Nacional, que emite o CNPJ, à Vigilância Sanitária, Corpo de Bombeiros, Meio Ambiente. E também com a prefeitura, que dá a licença de localização. O sistema tem que ser integrado e privilegiar classificações de risco. O baixo risco representa 80% das atividades. Portanto, podemos dispensar esse segmento de vistoria prévia. Mas sem dispensar a fiscalização posterior. O objetivo é não amarrar a abertura.

Isso não implicaria uma profunda mudança de mentalidade em relação ao padrão de atuação?

Afif  – Temos que começar a acreditar nas declarações das pessoas, porque a burocracia não acredita, não confia, não capacita e, depois, não fiscaliza. O que precisamos fazer é confiar, autorizar imediatamente e depois fiscalizar. Se a pessoa mentiu, enganou, logrou, feche-se a empresa. Mas vamos acreditar na palavra das pessoas,  no que elas escrevem. Necessitamos enfrentar essa barreira democrática para podermos facilitar a vida das pessoas.

Além da herança cartorial, existe a cultural. O que fazer para mudar?

Afif  – É verdade. Convivemos também com a herança cultural que parte do princípio de que a esmagadora maioria das pessoas mente. Não é verdade. Noventa e oito por centro da população brasileira são corretos. Mas por conta de dois por cento que mentem,  a maioria sofre. Temos que mudar essa cultura. E o nosso papel, na Secretaria, é levar em frente a decisão de mudar. De retomar a cruzada da desburocratização, lançada há alguma décadas por Hélio Beltrão.

O  empresariado de pequeno porte foi beneficiado com a criação do Simples. Mas, em seguida, com a introdução da substituição tributária, foi duramente prejudicado. O que a Secretaria pode e pretende realizar?

Afif  – A questão da tributação é um nó górdio a ser desfeito em regime de urgência. Um exemplo perfeito desse problema é o caso do pequeno mercadinho versus o grande supermercado. O pequeno está no Simples e, por isso, tem uma taxa favorecida, principalmente no ICMS na ponta, que não é calculado sobre o valor da transação, mas do faturamento da empresa. Ocorre que as burocracias estaduais deram um golpe no pequeno empresário. Criaram o contribuinte substituto, que coloca a carga cheia no produto quando da saída da indústria. Em virtude disso, o pequeno empresário teve anulado o poder de competição, que lhe fora garantido por legislação. Como dizia Roberto Campos,  cada ação desburocratizante corresponde a uma reação da burocracia, em igual intensidade e em sentido contrário, mas que ocorre de forma disfarçada. Então, você dá o benefício e, de forma disfarçada, tira. Portanto, o contribuinte substituto é um instituto que não cabe ao micro e ao pequeno empresário.

Uma outra grande dificuldade é a dificuldade de acesso ao crédito. O BNDES, por exemplo, não atua no varejo. Quais as medidas que a Secretaria pretende adotar para solucionar esse problema?

Afif  – O BNDES não é um banco para atender a pequena empresa. Ele não tem cacoete para isso.  Temos que trabalhar com bancos que tenham essa especialidade. Como, por exemplo, o Banco do Nordeste do Brasil, que construiu uma história de sucesso no âmbito do programa de microcrédito. O Banco do Brasil está começando a operar nesse segmento. A Caixa Econômica Federal, também. A Secretaria abriu entendimentos com bancos privados, com redes de grande alcance, para trabalhar linhas de crédito simplificadas. Precisamos oferecer acesso aos micro e pequenos empresários, aos investimentos, à compra de máquinas, à aquisição de bens de produção, cuja garantia seja a do próprio produto, que é a da alienação fiduciária. A Secretaria está elaborando projetos para facilitar o acesso ao crédito.

O senhor já manifestou a intenção de propor o Simples internacional. Qual a sua ideia?

Afif  – As medidas que a Secretaria tomará para desburocratizar a vida do micro e do pequeno empreendedor têm como meta possibilitar que esse segmento da economia produtiva adquira  maior competitividade, o que exigirá a expansão da produção e permitirá tanto uma maior lucratividade quanto mais geração de empregos. Entre as metas elencadas para atingir esse fim, vamos propor, durante a Cúpula Íbero-Americana, que se realizará em agosto, no Panamá, a criação de uma zona livre internacional de comércio, o Simples internacional.  O objetivo é permitir aos micro e pequenos empresários do Brasil, da Espanha, de Portugal, dos países da África lusófona, do Caribe e da América Latina realizar transações comerciais com base em um novo modelo de comércio internacional.

Como funcionará esse mercado internacional?

Afif  – A concepção contempla o tratamento recíproco, alfandegário e tributário. O modelo prevê o porte da empresa, e não produtos. Os entendimentos entre os países serão bilaterais. Para instrumentalizar a negociação de negócios será criado um portal. A operação entre as micro e pequenas empresas ocorrerá por intermédio de um único documento, a ser adotado de comum acordo entre as partes que celebrarem esse inédito modelo, cuja característica maior será a simplicidade.

O que representará, no seu entendimento, a criação do Simples internacional?

Afif  – A criação do Simples internacional vai garantir, afinal, que a globalização chegue às MPEs, porque, até  o momento, a globalização é assunto exclusivo das grandes empresas, das grandes corporações. Com a oferta de um portal eletrônico, as micro e pequenas empresas, valendo-se de uma linguagem padronizada, taxonômica, poderão se encontrar e negociar produtos, que serão enviados pelo correio. A vantagem para o micro e pequeno empresário é que os valores negociados não implicarão mudança de faixas das empresas.

O brasileiro cultiva hoje grande interesse em tornar-se seu próprio patrão. Como a Secretaria contribuirá para a realização desse sonho?

Afif  – O brasileiro é um empreendedor. Tanto isso é verdade, que existem hoje, no País, cerca de 12 milhões de empreendedores informais. Só no Estado de São Paulo, são 3,5 milhões. Isso significa a população do Uruguai. A pergunta a ser feita é: por que esse contingente prefere ficar escondido. É por que opera em um ramo marginal?  A resposta é singela: não.  Ele optou pela informalidade em virtude das imensas dificuldades que enfrenta para se legalizar. Exatamente por isso trabalhamos para  criar o MEI (Microempreendedor Individual).

Quais as metas de curto e médio prazo  em relação ao MEI?

Afif  – Com a criação do MEI, temos hoje, em um prazo de apenas quatro anos, dois milhões de inscritos.  A meta é crescer 10% ao ano, com a formalização desses prestadores de serviços, como ladrilheiros, carpinteiros, cabeleireiras, manicures, por exemplo.  Para isso, vamos realizar um trabalho de incentivo, porque no momento em que esses profissionais se legalizam, a partir do instante em que ingressam no mercado formal de trabalho, adquirem direitos cidadãos. Contra um pagamento que varia entre R$ 35,00 e R$ 39,00, passam a ter direito à Previdência Social. O MEI, sem nenhuma sombra de dúvida, é o maior programa de inclusão social hoje existente.

Como o senhor pretende ampliar a adesão dos prestadores de serviços  informais ao MEI?

Afif  – Temos de ir atrás deles. Tem que ser realizada uma grande mobilização. Precisamos ter agentes de desenvolvimento nas comunidades, porque os empreendedores dessas áreas, que são em grande quantidade, têm medo de procurar o Estado. Quando ele procura o poder, defronta-se com uma carga burocrática que o espanta, que o atemoriza.  Entre outros problemas, há, inclusive, um golpe que está sendo aplicado contra os microempreendedores individuais.

Que golpe é esse?

Afif  – Depois que os prestadores de serviço informais se inscrevem no MEI, recebem mensagens sobre a obrigatoriedade de contribuir para uma associação sindical. Essas mensagens são enviadas por meio de  telefone celular. Em seguida, eles recebem boletos de cobrança, no valor de R$ 300,00. É uma ilegalidade. Uma fraude. O microempreendedor não tem de pagar nenhuma contribuição sindical ou patronal. É, na realidade, um estelionato. O MEI está isento de taxas. Ele só tem de pagar a Previdência Social. O microempreendedor individual que receber uma cobrança desse tipo deve ir ao Sebrae mais próximo ou a um clube de lojistas e denunciar o golpe, porque os fraudadores podem ser identificados nos boletos bancários de cobrança.

Então os microempresários individuais não são obrigados a contribuir para nenhuma associação?

Afif  – Não. Em hipótese nenhuma. Ele não tem de pagar nenhum tostão a nenhuma associação, seja ela qual for. Quem receber o boleto, pode rasgar. E são vários os portais que estão no ar aplicando golpes contra os microempreendedores individuais. O único portal oficial é o www.portaldoempreendedor.gov.br. Então, para deixar claro, cuidado com o 171 que está aí.

 

Fonte : Diário do Comércio e NBR

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