Empreendedorismo pode resgatar comunidades da violência no Rio, diz Afif

29 de março de 2018
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Qual a melhor saída para a crise de segurança pública que o país atravessa? É o militarismo, como alguns acreditam? Combater a violência com mais violência? Ocupar as comunidades com forças policiais? Este debate parece ser cansativo, dado o desânimo que as soluções repetitivas e ineficientes têm causado. O fato é que a intervenção federal no Rio de Janeiro, sozinha, não vai resolver o problema da violência. Está ficando evidente a cada dia.

E a lógica deste raciocínio é bem simples. É como ter uma máquina que faz parafusos tortos. Não adianta jogar fora as peças defeituosas. É preciso consertar a máquina. E a máquina, a qual nos referimos, é o sistema –na verdade, os sistemas. Um sistema político com regras anacrônicas que não permitem a renovação da política, nem a redução da corrupção. E um sistema econômico com regras igualmente defasadas, cheio de privilégios e concentrações de mercado e diria até preconceituoso. Principalmente com os pequenos negócios.

Na verdade, a saída para a violência urbana passa por uma ocupação social e econômica das comunidades. As favelas são verdadeiras cidades, com governos próprios, tribunais que julgam seus desvios, normas e regras bem definidas e uma economia que funciona independente do poder público. Aliás, ele só consegue entrar ali à força.

São mais de 12 milhões de pessoas morando em favelas no Brasil e movimentando cerca de R$ 70 bilhões por ano. Esses são os dados trazidos por pesquisa feita pelo Instituto Data Favela em parceria com a Central Única de Favelas. Ainda de acordo com a pesquisa, boa parte dos moradores de favelas sonha em ser empreendedor e ter seu próprio negócio.

Este desejo de “não ter patrão” é motivado pelo que se denomina como razão empreendedora, ainda que disso decorra estar fora dos direitos trabalhistas. O empreendedorismo ganhou força num cenário que une reestruturação do mundo do trabalho, altos índices de desemprego e aumento da informalidade. A consequência é o cidadão assumir ações que caberiam ao Estado.

Apostando no aumento da participação que as micro e pequenas empresas têm apresentado na economia brasileira e nas mudanças que têm ocorrido no mundo do trabalho, o Sebrae vem investindo no empreendedorismo em favelas. São programas como o “Favela Mais” e o “Menor Aprendiz”, que ajudam a tirar jovens e trabalhadores das mãos do narcotráfico e da criminalidade em geral. Aliás, aqui entra um tema que cabe num outro artigo para ser devidamente debatido: o consumo das drogas e o que fazer com ele e com o mundo que o cerca.

Por meio de cursos, atendimentos, formalizações, eventos, incentivos e facilitação na obtenção de microcrédito, o Sebrae tem procurado colaborar no esforço, nem sempre bem-sucedido, de “pacificação” das favelas cariocas. O que queremos é levar o desenvolvimento socioeconômico às áreas atendidas. Mas claro que isso somente será possível se a violência for controlada ou se houver paz nestes locais.

Sempre buscando soluções ousadas para problemas do cotidiano brasileiro, estamos agora entrando numa nova fase. A Cufa (Central Única das Favelas) foi uma das primeiras entidades a perceber o potencial que a palavra “favela” possui em termos de marketing e mesmo fascinação junto a alguns segmentos da sociedade brasileira e mundial. Basta ver como o turismo subiu os morros do Rio.

Juntamente com a Cufa, o Movimento Viva Rio e o Rock in Rio de Roberto Medina, o Sebrae está ajudando a construir um acordo que virá da sociedade organizada em direção às favelas, sem a participação inicialmente do poder público. A Cufa foi às comunidades do Rio de Janeiro, com o Instituto Data Favela, e descobriu que 42% dos mais de 12 milhões de moradores de favelas do país pretendem iniciar o próprio negócio, contra 26% dos demais brasileiros. A consulta indicou, também, que 92% dos moradores das favelas utilizam as redes sociais.

Se usarmos a liderança da Cufa, a representatividade do Viva Rio, a criatividade de Medina e a experiência do Sebrae poderemos estar plantando a semente de uma das saídas para a crise de segurança pública no Brasil. Por que não levar o empreendedorismo das favelas a eventos como o Rock in Rio? Esta é a hora para estimularmos o mercado consumidor interno e promover o espírito empreendedor.

Se, por um lado, é pelo consumo que os moradores se tornam “cidadãos”, pelo outro a inclusão pressupõe que os moradores virem agentes de algum empreendimento. Estes vão substituir os antigos gerentes do comércio ilegal e promover o associativismo local, mudando a relação com os diferentes agentes, públicos e privados, que operam nestes territórios.

Somente o empreendedorismo poderá se transformar na mola propulsora das comunidades, hoje reféns do medo, da violência e do tráfico. A força de trabalho dos cidadãos é libertadora. E, com ela, a cidadania vai tomar o espaço antes ocupado pela criminalidade.

Fonte: Opinião, Poder 360

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