A vez dos pequenos

18 de junho de 1995
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Micro e pequenos empresários de todo o País sentem na pele, hoje, como é duro obter recursos para investimentos em produção. As dificuldades são inúmeras, algumas quase intransponíveis – e o próprio Presidente Fernando Henrique Cardoso já demonstrou estar ciente delas, pois, há pouco mais de um mês, em visita à Amazônia, manifestou o desejo de criar o Banco do Povo, uma instituição para atender a empresários e cidadãos com problemas de acesso aos créditos bancários convencionais.

A realidade está expressa em números. Um exemplo aparece em pesquisa recente do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), que revelou que, de 477 pequenos e microempresários entrevistados, 69% não realizaram investimentos nos últimos seis meses por falta de recursos próprios e das altas taxas de juros cobradas pelo sistema financeiro.

A instituição, no entanto, pretende ir muito além das pesquisas e desenvolveu um projeto para a criação do “Programa Nacional de Crédito Orientado”, com o objetivo de facilitar o financiamento em até US$ 20 mil para os pequenos negócios. Na prática, essa ideia nada mais é do que a concretização da proposta de fundação do Banco do Povo, sonhado pelo Presidente da República, embora o programa de crédito proposto pelo Sebrae não fale em criar um novo banco, mas em reorientar os recursos já existentes, porém, dispersos.

Recursos, na realidade, não faltam. O Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) tem US$ 1,5 bilhão no BNDES para financiar projetos. De acordo com a proposta do Sebrae, uma parte desses recursos poderia ser repassada ao Banco do Brasil e à Caixa Econômica Federal para financiar pequenos projetos, que geram mais empregos e renda. O Sebrae entraria no programa com a criação de um “Fundo de Aval”, que garantiria, de forma suplementar, as operações de crédito.

Com apenas um terço dos recursos do FAT para o financiamento dos pequenos e microempresários, teríamos aproximadamente US$ 1 bilhão, contando as contrapartidas do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal. Além do “Fundo de Aval”, o Sebrae poderia também oferecer assistência gerencial aos microempresários.

Dessa forma, o “Programa Nacional de Crédito Orientado” financiará o desenvolvimento e atenderá a milhares de pequenos, para quem o acesso ao crédito no Brasil é muito difícil. A grande maioria tem capacidade para produzir, mas não possui bens suficientes para dar em garantia ao financiamento.

O próprio Sebrae tem experiências anteriores que apontam a viabilidade da proposta. Há anos, foi desenvolvido na Bahia e em Pernambuco o Projeto Uno, em convênio com uma fundação norte americana, destinado ao atendimento de pessoas de baixa renda. O órgão depositou em bancos participantes do Programa um valor que servia de garantia para empréstimos a pessoas selecionadas e orientadas pelos agentes do Cebrae (na época, a sigla era essa, com “c”). O programa permitiu a compra de ferramentas e equipamentos de trabalho para costureiras, marceneiros, eletricistas, jardineiros etc. e apresentou inadimplência inferior à das demais linhas de crédito.

Atualmente, o maior obstáculo à realização de programas semelhantes é a dificuldade de obtenção de recursos que possam ser emprestados a taxas suportáveis a atividades de baixo retomo. Também inexistem mecanismos de garantia que motivem o sistema bancário a operar com essa faixa de população. A proposta do Sebrae, que será levada ao Presidente Fernando Henrique Cardoso, torna viável o acesso ao crédito por empresas que não disponham de garantias complementares para a obtenção de financiamento para máquinas e equipamentos. O mesmo mecanismo poderá beneficiar a população de baixa renda, complementando programas desenvolvidos por muitas entidades no sentido de assegurar a ocupação de pessoas que não conseguem empregos, como o da Federação Nacional de Apoio aos Pequenos Empreendimentos (Fenape).

A proposta do Sebrae, no entanto, de criação do verdadeiro Banco do Povo, só será possível se o Governo mudar a atual política de juros altos, que está asfixiando as empresas, principalmente as pequenas.

 

 

Publicado no Diário Popular 18/06/95

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